Mercado
Sustentabilidade torna-se variável económica no imobiliário
Os projetos mais sustentáveis e vanguardistas do mercado estão a dar o exemplo. “Temos de encarar a sustentabilidade como uma mitigação de risco, e não como uma questão de marketing. Porque a sustentabilidade, finalmente, dá dinheiro”.
28/10/2025
A sustentabilidade assume-se hoje como uma variável económica dos projetos imobiliários. Deixou de ser vista apenas como um custo ou pelo marketing, e cada vez há menos dúvidas do valor que aporta, e do contributo de responsabilidade que tem para o futuro de todos. Esta foi uma das principais conclusões do debate “Sustentabilidade na primeira pessoa”, promovido pela WIRE.
Este pequeno-almoço executivo foi organizado pela associação das mulheres no imobiliário na última quarta-feira na sede da PLMJ, em Lisboa, e convidou associadas, mentoras, patrocinadores e parceiros para um momento de partilha e reflexão sobre a construção de um imobiliário mais sustentável. Até porque este setor é responsável por cerca de 40% das emissões globais de CO2 e tem, por isso, um papel decisivo nas alterações climáticas.
O caso do edifício de escritórios POP – Porto Office Park serviu de exemplo para arrancar esta discussão. Andrea Ferreira, do Grupo Violas Ferreira, que promoveu o projeto, recordou que “começámos a ter esta experiência com a construção destes escritórios, numa altura em que a sustentabilidade ainda era vista só como um custo. Hoje, já sabemos que os custos são muito mais baixos neste edifício precisamente por causa das medidas de sustentabilidade que implementámos. E o que é certo é que o edifício com certificação BREEAM Excelent foi rapidamente ocupado. Os clientes têm interesse em ter custos de operação mais baixos, valorizam isso”.
Margarida Caldeira, da Broadway Malyan, que esteve envolvida neste projeto, conta que “foi um trabalho de equipa, e é muito relevante o facto de o promotor ficar com a posse do ativo ao longo do seu tempo de vida. Importa muito quem paga a conta da energia ao longo do tempo”. E recorda que “pequenas coisas, como aproveitar declives do terreno ou optar por dois blocos em vez de três, já podem ser escolhas muito sustentáveis”.
Participando também neste encontro, André Gaspar, do DST Group, partilhou a sua experiência na área da construção industrial e modular. O grupo tem um showroom, laboratório “vivo” e centro de desenvolvimento em Braga, e está atualmente a criar três novas fábricas. Questionado sobre vantagens e custos, conta que alguns materiais, como a madeira, ainda encarecem os projetos em cerca de 15%, “mas o valor económico é algo distinto. Poupamos muito em custos de estaleiros, por exemplo, e a própria previsibilidade do processo tem um valor económico elevado, que impacta toda a cadeia de valor do produto”.

“Nos últimos 20 anos, temos vindo a ‘pregar aos peixes’, mas tudo valeu a pena”, acredita Isabel Santos, do GreenLab. “Temos uma visão muito focada nas certificações, mas o nosso trabalho já vai muito além disso e fazemos o trabalho diretamente com o promotor, somos reconhecidos e valorizados pelos nossos clientes. Porque o projeto faz-se com todos sentados à mesma mesa, não é com um em cada gabinete que mudamos o mundo”. Defende que “temos de encarar a sustentabilidade como uma mitigação de risco, e não como uma questão de marketing. Porque a sustentabilidade, finalmente, dá dinheiro, não só pelos fundos e pelas entidades financeiras que valorizam os spreads”.
Moderando o debate, Patrícia Barão, da Dils, recordou que a sustentabilidade ainda é vista como um custo para 70% dos promotores imobiliários, segundo um estudo recente da Deloitte. “É preciso desmistificar isto, como é que se dá este passo?”
Isabel Santos admite que “o mais difícil é mudar as mentalidades, mas temos de estar atentos às mudanças”, dando o Build to Rent como exemplo de produto versátil e interessante para responder às novas necessidades de oferta habitacional, tanto de mobilidade, como de custos mais acessíveis. “Esses promotores [que encaram a sustentabilidade como um risco] não estão a pensar no risco que correm. Porque o mundo está a mudar, e não estamos só a construir para quem cá está agora, estamos a construir para o futuro. A sustentabilidade vai ter de ser ‘business as usual’”, em vez de uma exceção.
Otimista para o futuro, Margarida Caldeira lembra que o mesmo aconteceu com o segmento dos escritórios, “até aparecerem os primeiros fundos que queriam ter a sustentabilidade como ponto essencial do projeto. Foi isso que ditou as regras, porque o mercado dita sempre as regras. A partir daí, tudo mudou, e eu acho que o residencial vai mudar a partir do momento em que o mercado dite essas regras, nomeadamente a partir de melhores condições de crédito [para projetos sustentáveis]”.
André Gaspar corrobora que “houve uma contaminação muito positiva quando começaram a entrar os primeiros grandes fundos imobiliários em Portugal, por isso é um caminho sem volta”.
Os especialistas presentes concordaram ainda que, apesar de existirem diretivas europeias comuns, a verdade é que já não é necessário esperar pelas transposições para agir, o imobiliário sai a ganhar se for seguindo as melhores práticas dos outros países. De qualquer forma, são necessários mais incentivos, nomeadamente fiscais, e outras iniciativas que promovam e privilegiem a sustentabilidade, para que seja sempre vista como parte da economia.