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Conhecimento, foco e ser feliz: a receita de uma mulher forte do imobiliário

Os desafios da liderança e de encontrar o equilíbrio (certo) na vida e profissão. Patrícia Barão em entrevista ao idealista/news.

14/03/2023

Conhecimento, foco e ser feliz: a receita de uma mulher forte do imobiliário
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A carreira no imobiliário começou há muitos anos. Hoje, desdobra-se em funções e desempenha vários papéis de liderança no setor. Nunca sentiu que foi beneficiada ou prejudicada por ser mulher, até porque acredita que o talento, o profissionalismo, a competência ou a honestidade não têm sexo. Ainda assim, Patrícia Barão reconhece que a pressão de “ser a única mulher na sala” pode ser "esmagadora". Decidiu acreditar em si, trabalhar muito e valorizar todas as suas conquistas. Na sua opinião, um dos grandes desafios, tanto para mulheres como para os homens em cargos de liderança, passa por fazer uma boa gestão daquilo que é mais precioso: o tempo e as pessoas. Para assinalar este Dia Internacional da Mulher, o idealista/news entrevistou aquela que é um das (muitas) mulheres fortes do imobiliário português.

Patrícia Barão é responsável pela direção do departamento residencial na JLL, é diretora na WIRE – Women in Real Estate Portugal, e ainda vice-presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP). O imobiliário, garante, traz-lhe uma “verdadeira sensação de realização pessoal e profissional”, mas para ter sucesso e "vingar" na profissão, diz, são precisos vários ingredientes:

ter um conhecimento profundo do setor, foco, saber ouvir, confiar em nós próprios e nas equipas e, acima de tudo, ser feliz naquilo que fazemos. Estas são as "linhas mestras" que nortearam o caminho desta profissional do imobiliário.

Um dos mais recentes desafios, que assumiu na WIRE, passa precisamente por identificar jovens mulheres com talento, vontade e ambição para "desenharem as suas carreiras no setor e capacitá-las através de programas de mentoring", através de cursos e formações em universidades nacionais e internacionais, protocolos e acordos, mas também programas de estágio e uma bolsa de emprego.

Diz-se uma "pessoa de pessoas". Inspira-se nelas, mas também nos livros, nas viagens e na natureza para encontrar o equilíbrio certo (e necessário) entre a vida profissional e familiar. Nesta entrevista, Patrícia Barão deixa alguns conselhos para uma melhor gestão do tempo e a nível emocional, e garante que no final "tudo se compensa, com dedicação, organização e amor".

A Patrícia é um rosto bem conhecido no setor, também pelos “vários” papéis que desempenha, seja enquanto diretora na WIRE – Women in Real Estate Portugal; assumindo a direção do departamento residencial na JLL ou ainda a vice-presidência da APEMIP. Como que é ser mulher e fazer carreira no imobiliário em Portugal?  

Ser mulher e ter a oportunidade de desenvolver a minha carreira num setor dominado pelo mundo masculino é ótimo! Adoro trabalhar com pessoas inteligentes, bem formadas e dedicadas, sejam elas homens ou mulheres, pois não acredito que a capacidade profissional seja distinguida por géneros.

Nunca senti que fui beneficiada ou prejudicada por ser mulher e tive a sorte de ter tido grandes mentores homens, que me ensinaram desde cedo que o talento, o profissionalismo, a competência ou a honestidade não têm sexo. Na JLL Portugal cerca de 50% dos cargos da direção são assumidos por mulheres e na APEMIP, onde assumo o cargo de vice-presidente, somos três mulheres na direção.

Adoro trabalhar com pessoas inteligentes, bem formadas e dedicadas, sejam elas homens ou mulheres, pois não acredito que a capacidade profissional seja distinguida por géneros.

Tenho permanecido fiel a mim mesma e aproveito os meus pontos fortes para contribuir para o crescimento e evolução do setor pelo qual sou apaixonada: o imobiliário. Esta tem sido a minha estratégia para superar as noções pré-concebidas de que o imobiliário é um mundo de homens. Como mulher consigo trazer todo um mundo de diversas experiências físicas, mentais e emocionais para as discussões no imobiliário. As mulheres pensam de maneira diferente dos homens, como resultado das suas experiências. Esta diferença deve ser usada em pleno para acrescentar e contribuir para o sucesso das empresas e organizações. Num mercado tão competitivo como o imobiliário, a diversidade de género é um bom negócio! As mulheres trazem perspetivas, ideias e experiências únicas para as discussões, que enriquecem as conversas e levam à tomada de melhores decisões. Sinto várias vezes isso no meu papel diário na JLL.

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Foto de Nick Fewings no Unsplash

O que é que a apaixona (e continua a apaixonar) neste “mundo”?  

Apaixonam-me os desafios do setor, apaixonam-me as pessoas e apaixonam-me os projetos. Ainda mais, ao ver que o nosso trabalho vai impactar a construção e a dinâmica das cidades, a melhorar a vida das pessoas, e participar no crescimento do nosso país. Mesmo com todos os desafios inerentes a um setor tão exigente e complexo, não deixa de ser um setor em permanente mudança. Além disso, é um setor que envolve emoções e isso motiva-me diariamente e traz-me uma verdadeira sensação de realização pessoal e profissional. 

Até hoje, quais foram os principais obstáculos que teve de enfrentar neste universo tipicamente masculino?

A verdade é que nunca senti verdadeiramente dificuldades em ser mulher, mas já vivi algumas situações mais desconfortáveis, como entrar numa sala de reuniões com dezenas de pessoas e perceber que sou a única mulher na sala. A pressão de ser a única pode ser esmagadora, por muito que sejamos seguras de nós próprias, sentimos a energia do grupo maioritário, seja intencional ou não. A minha estratégia foi sempre acreditar em mim, trabalhar muito, valorizar todas as minhas conquistas e seguir a minha intuição. Um dos grandes desafios, e aqui será tanto para as mulheres como para os homens em cargos de liderança, é fazermos uma boa gestão daquilo que temos como mais precioso: o tempo e as pessoas.

A pressão de ser a única pode ser esmagadora, por muito que sejamos seguras de nós próprias, sentimos a energia do grupo maioritário, seja intencional ou não. A minha estratégia foi sempre acreditar em mim, trabalhar muito (...)

Como superou as dificuldades?

Seguindo sempre a minha intuição e garantido que confio ao máximo no meu potencial e no potencial da minha equipa. Na JLL, sei que tenho a sorte de ter os melhores comigo e que são verdadeiros experts no seu trabalho e isso dá-me uma segurança tremenda. Outro dos fatores que são para mim decisivos para ultrapassar desafios, é precisamente enfrentá-los. É isso que devemos fazer: parar para perceber o que temos de enfrentar e focar na solução, não no problema.

Quais os “ingredientes” necessários, ou linhas mestras a seguir, para “vingar” na profissão?

Entre vários ingredientes, diria que destaco o conhecimento profundo do setor, foco, saber ouvir, confiar em nós próprios e nas nossas equipas e, acima de tudo, ser feliz naquilo que fazemos. Passamos talvez 60% ou 70% do nosso tempo no trabalho, durante toda a nossa vida. Se não formos felizes aí, como podemos ser no resto?

O que fazer para equilibrar (mais e melhor) as forças no mundo dos negócios?

Acho que, no geral, o caminho nas empresas, e em especial na JLL, onde temos uma cultura interna fora de série, tem sido bastante positivo. Temos, como já referi, uma igualdade de género cada vez maior nas posições de liderança e a preocupação com os colaboradores é cada vez mais notória. Se calhar há uma década todas as questões do bem-estar no trabalho não se colocavam. Acho que medidas como estas e para a retenção de talento têm contribuído significativamente para equilibrar todas as forças no mundo de negócios, resultando numa melhor produtividade, ambiente e crescimento das empresas. Se motivamos as nossas equipas, os resultados serão certamente impactados. É um círculo vicioso que só gera positivismo.

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Foto de Miguel Á. Padriñán no Pexels

Está na linha da frente da WIRE...quais são os objetivos desta organização? 

A WIRE é uma associação que pretende aumentar a visibilidade das mulheres no setor do imobiliário e da construção, impulsionando a sua representatividade e defendendo os seus interesses no seio do setor, posicionando-as como participantes ativas e de referência. Com a forte convicção de que, unidas sob este objetivo comum, construiremos uma forte rede de confiança e apoio, que nos permitirá acrescentar valor e uma perspetiva única ao setor. A WIRE pretende ser um motor de transformação junto do setor, trazendo ao mercado uma nova perspetiva, novas formas de pensar e analisar a realidade, numa atitude de complementaridade e acréscimo de valor a todo o mercado.

A WIRE é uma associação que pretende aumentar a visibilidade das mulheres no setor do imobiliário e da construção, impulsionando a sua representatividade e defendendo os seus interesses no seio do setor

Atualmente, quais são os rostos que fazem parte da WIRE? 

Na direção somos sete mulheres: a Presidente Filipa Arantes Pedroso, a Margarida Caldeira, a Susana Pascoal, a Irina Va, a Andrea Violas Ferreira, a Diana Polignac de Barros e eu.

Como pretendem ajudar outras mulheres a ter sucesso no imobiliário? Fazem mentoria, por exemplo? 

O meu pelouro é precisamente o da formação e mentoring onde o objetivo passa por identificar jovens mulheres com talento, vontade e ambição para desenharem as suas carreiras no setor e capacitá-las através de programas de mentoring, convertendo potencial em talento. Vamos promover o acesso a Cursos e formações em universidades nacionais e internacionais através de protocolos e acordos e vamos ter encontros com oradores convidados onde se debatem temas da atualidade e temas que façam sentido na esfera da WIRE.

Estão a promover algum tipo de projeto/iniciativa? Se sim qual (quais)?

Estamos a promover várias iniciativas. Dentro da minha responsabilidade, temos o programa de estágios para jovens de forma a proporcionar um primeiro contacto com o mercado de trabalho no setor. A criação de uma bolsa de emprego WIRE a que as mulheres se podem candidatar, cursos e formações e encontros onde se debatem temas da atualidade.

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Foto de Tima Miroshnichenko no Pexels

Como é que a WIRE vê o programa Mais Habitação apresentado pelo Governo? Quais os pontos fortes e fracos?

O acesso condigno à habitação é um tema que nos preocupa a todos e temos estado especialmente atentos às medidas que têm vindo a ser propostas – ainda que não finais –, pelo Governo. Na minha opinião, diria que a medida mais positiva é a de agilizar os licenciamentos com a responsabilização dos projetistas. No entanto, é essencial concretizar como será posta em prática e, de uma forma geral, perceber como aplicadas as iniciativas propostas. Quanto aos pontos fracos, acreditamos que as medidas para já apresentadas, poderão não resolver o grande problema da habitação - a falta de oferta -, como também poderão eliminar as possibilidades de Portugal ter um mercado de arrendamento a funcionar em condições.

Simultaneamente, será interrompido um dos programas de captação de investimento externo mais bem-sucedido de sempre – os Vistos Gold. Sobre este tema, é importante realçar que apenas 6% das casas comercializadas nos últimos 4 anos foram vendidas a estrangeiros e, naturalmente, que nem todo o investimento estrangeiro tem um Visto Gold associado. No meu entendimento, o caminho na habitação passa por criar incentivos para se produzirem mais casas, em mais cidades e para mais classes económicas, garantindo que o financiamento externo não é esquecido, já que é tão importante para o desenvolvimento da nossa economia.

Como e onde é que a Patrícia se inspira para inspirar outras mulheres? 

Sou uma pessoa de pessoas e inspiro-me em pessoas, livros, viagens que faço, na natureza e na vida no geral. Há imensas coisas que me inspiram. O que tento sempre é absorver ao máximo essa inspiração e aplicá-la em bom: em mim e nas pessoas com que me cruzo na vida.

Por fim, como encontrar o equilíbrio certo (e necessário) entre a vida profissional e familiar? Ser mulher, profissional, ter tempo para a maternidade, para a individualidade... 

Para estar em plena consciência na minha vida, não prescindo do tempo para o meu yoga e meditação. Sem este tempo para mim não estou em pleno para tomar as melhores decisões e liderar as mais de 180 pessoas que tenho a meu cargo. Por outro lado, não prescindo do tempo para a minha família, que é o meu grande pilar. O meu lema é estar totalmente entregue ao que estou a fazer naquele momento e estar em pleno ali, viver cada momento. É preciso aceitar a mutação do conceito balanced-life para blended-life, em que vivemos com várias realidades misturadas. Aceitando isso, é mais fácil equilibrar todos os campos da nossa vida.  Acredito que devemos olhar para tudo e ver o lado positivo e no final tudo se compensa, com dedicação, organização e amor.

O meu lema é estar totalmente entregue ao que estou a fazer naquele momento e estar em pleno ali, viver cada momento.

Que conselhos deixaria para uma melhor gestão de tempo e a nível emocional? 

Ser organizada e manter sempre o foco naquilo que são as prioridades. Sei que às vezes não é fácil e há sempre aqueles dias que nos deixam loucos e correm completamente ao contrário do programado. Mas acredito que mesmo esses acabam bem. Para mim, tem muito a ver com a nossa atitude perante os desafios. E, se conseguirmos parar, pensar e depois atuar, tudo corre sempre melhor. É o tal blended-life que refiro acima. Ter a oportunidade de gerir o nosso tempo permite-nos organizar o nosso dia garantindo que estamos a colocar a nossa energia no tema certo. Este é para mim o verdadeiro conceito de boa gestão do tempo.

Fonte: Jornalista Leonor Santos, Idealista,