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Mais Habitação ou nada vai mudar?

A partir de 16 de fevereiro de 2023 foram sendo apresentadas várias medidas no pacote “Mais Habitação” que têm sido muito criticadas por se entender que não resolvem o problema da habitação, salvo as que dizem respeito à simplificação do licenciamento.

22/06/2023

Mais Habitação ou nada vai mudar?
Filipa Arantes Pedroso

Se o que se pretende é mais habitação a preços mais baixos é fundamental aumentar a oferta que é escassa em relação à procura, bem como baixar impostos.

Com efeito, qualquer promotor que adquira um terreno para construir habitação, seja para venda, seja para arrendamento, paga IMT (6%), Imposto de Selo (0,8%), IVA da construção (23%), não reembolsáveis, para além das demais taxas pagas aos municípios. Estes impostos que têm de ser incluídos no preço de venda atingem mais de 30%, se acrescentarmos as taxas municipais, não será demais falar em 40% não reembolsáveis. O AIMI que era provisório, mas que parece passou a definitivo, deveria também deixar de ser aplicável aos terrenos e edifícios para habitação.

O sucesso da reabilitação urbana deveu-se fundamentalmente, à eliminação destes impostos, IMT e IVA, medidas que foram agora esquecidas para a construção nova. Estas isenções fiscais são essenciais quer para o arrendamento em geral, quer para a construção nova.

Quanto à oferta, o número de casas novas construídas para habitação familiar na década 2000-2010 foram 875.000, enquanto na década 2011/2022 foram construídas cerca de 150.000, ou seja tivemos uma redução de cerca de 80% de fogos novos construídos, por cada 10 fogos vendidos foi construído 1. Esta situação originou um enorme desequilíbrio entre a oferta e a procura existente, que tem como consequência a subida dos preços da habitação a que temos vindo a assistir.

O arrendamento acessível, Programa de Apoio ao Arrendamento, foi já objeto de algumas medidas de isenção de IMI e IMT, mas é ainda insuficiente para que o mesmo seja economicamente viável, de acordo os promotores. Acresce que as medidas de limitação de aumento de rendas e congelamento de rendas anteriores a 1990, são medidas que retiram confiança dos proprietários. Este é aliás um dos grandes problemas das medidas “Mais Habitação”, a quebra de confiança dos agentes económicos que veem mais uma vez a legislação relativa ao arrendamento urbano ser alterada. A estabilidade legislativa e fiscal é fundamental para a confiança dos investidores. Afetada a confiança dos investidores não haverá seguramente aumento de imóveis para arrendamento. Em Portugal o built to rent não teve sucesso até à data e continuará sem o ter, enquanto os investidores não acreditarem na estabilidade legislativa e fiscal do arrendamento.

Por outro lado, o fim das autorizações de residência para atividade de investimento, conhecida por Vistos Gold, a partir da publicação desta legislação, não vai trazer qualquer incremento no número de imóveis para habitação porque representa 0,6% das transações imobiliários, No entanto, o país vai perder investimento, note-se que desde 2012 foram cerca de 6,7 mil milhões de euros de investimento, para além dos postos de trabalho que esta atividade criou.

O mesmo se pode dizer do Alojamento Local que estava a ser gerido, e bem, pelos municípios, e que vai ser destruído com as medidas e agravamento de impostos que são propostas no pacote “Mais Habitação”. Importa recordar que foi o AL que reabilitou e deu vida aos centros históricos das cidades que estavam desertos. Acabar com o AL vai impactar não só no rendimento de pequenos investidores, mas também no comércio, restauração, cultura, mobilidade, etc. O AL tem vocação turística e não habitacional, é um erro pensar que com o fim do AL vamos ter mais arrendamento para habitação.

Quanto à única medida que os investidores veem com algum interesse, a simplificação e aceleração do licenciamento, parece ter algumas disposições positivas no que respeita a isenções de licença em determinadas situações, alterações ao RGEU e simplificação das licenças de utilização. Quanto ao deferimento tácito tem riscos acrescidos para os promotores que podem ver as suas obras embragadas pelos municípios por incumprimento de determinada legislação que o município em causa, considera aplicável. Importa ouvir os municípios sobre as medidas a implementar.

Em conclusão, as medidas propostas pela “Mais Habitação” são na generalidade negativas, excluindo algumas medidas relativas ao licenciamento, porque não vão aumentar a oferta de habitação para arrendamento, pelo contrário. Os incentivos à habitação nova, fundamental para que os preços possam baixar, não foi contemplada neste pacote. Assim, enquanto a procura for superior à oferta os preços vão continuar a subir e não vamos ter mais arrendamento.

Artigo Publicado na Vida Imobiliária